"Foi assim" - começou ele a relembrar a sigilosa companheira - "o escorpião precisava atravessar o rio. Chamou o jacaré e lhe pediu":
- Ei, jaca, me dá uma carona?
- Tá doido, eu boto você nas costas, você me morde a nuca...
- Quié isso, companheiro? Não sou ruim assim.
- Tá bom, eu levo você... - convenceu-se o jacaré. O escorpião saltou em suas costas. A travessia foi feita. Já na margem, ao invés de agradecer o favor e a confiança, o escorpião dá-lhe uma picada mortal. O jacaré, morrendo, ainda quis saber:
- Por que você fez isso?...
- Sei lá, é da minha natureza.
"Disse isso e afastou-se, sem qualquer sentimento de culpa, enquanto o jacaré fechava os olhos para sempre. Pronto, terminou a fábula".
Vendo que precisava ir um pouco mais adiante para não deixar dúvida nenhuma na cabecinha da namorada de ocasião, o Garanhão explicou: - "Na política a vida imita a fábula, minha dileta".
E se apressou a traduzir o pequeno conto numa linguagem ao alcance da garota que, se não fosse um dia candidata parlamentar, bem que poderia ser reitora de uma universidade qualquer por aí. O Garanhão foi bem didático:
"Naquele dossiê paulista que o Zé Serra disse outro dia que o mandante foi Aloízio Mercadante, Lula descobriu os 'aloprados do PT'; naquele outro dossiê, contra dona Ruth Cardoso, Lula assim que deu no jeito, nomeou Erenice Guerra, a autora do banco de dados, chefe da Casa Civil da República; agora, um dossiê inexistente derrubou o jornalista Luiz Lanzetta da armação dos palanques. Ele foi abatido pelo fogo amigo e cruzado de Palocci e Pimentel".
E fechou o papo com chave de ouro: "Moral da história... Surge, assim por acaso, a grande injustiçada Dilma Dossiêff. Aí, Lula não pode fazer nada: picadura é da sua natureza".
O Garanhão de Pelotas encerrou a conversa, deu um beijinho na menina, virou-se para o lado e dormiu. Os jornais foram parar embaixo da poltrona da frente.