20 de jan. de 2011

Pendurando a despesa

Pensa que a vida de um nobre falido é levada sempre na moleza? Ledo engano. O Garanhão de Pelotas não só já fez, como é capaz de qualquer coisa na vida. Assim que se formou em tudo - direito, jornalismo, letras portugues/ingles, psicologia, filosofia e sociologia - continuou desempregado, como senta bem no Brasil a qualquer pessoa que tenha diplomas para apresentar, ao invés de carteirinha do partido governante.

Nesse tempo, era garçom. Atuava com desenvoltura - em verdade vos digo, quase flutuava - por entre as mesas propositadamente rústicas da Taberna do Willy.

Naquela noite, lépido e gentil, apresentou a conta do lauto e requintado jantar a dois, para o elegante, bem-acompanhado e maneiroso freguês, mais conhecido nas boas casas do ramo por seus pequenos e costumeiros golpes, do que pelas gorjetas que deixava.

Ora, não seria só porque o garçom da casa era o Garanhão de Pelotas que o finório mudaria seu modus operandi. Naquele velho começo de noite ainda criança, o nosso serviçal superstar pressentiu que o caloteiro de fino trato agiria comme d'habitude. E não deu outra. Ao deparar-se com a apresentação da nota de despesas, o cliente foi direto ao assunto:

- Desculpe, moço, acho que esqueci a carteira em casa...
- Acontece, meu senhor... Mas, não faz mal, eu penduro a nota com o seu nome ali na parede e quando o senhor vier pagar a conta a gente apaga tudo. Eu mesmo tiro a nota dali.
- Nem pensar. Todo mundo vai ver meu nome aí. Isso é uma vergonha.
- Quê nada, meu senhor, eu vou pendurar o seu paletó ali ó, tapando a nota...

Assim que o Garanhão deu mostras de que pegaria mesmo o casaco no espaldar da cadeira do comensal, a carteira milagrosamente apareceu nas mãos do devedor. Até propina sobrou naquela noite, ainda criança.