Por ouvir dizer, ele ficou sabendo que o advogado, de 35 anos, se dirigira de carro a um cartório no centro da cidade. À cata de uma vaga exclusiva na rua, encontrou outro veículo estacionado nela.
O motorista deficiente encontrou um lugar mais à frente, coisa assim de 200 metros, estacionou e, em seguida, seguiu em sua cadeira de rodas até o cartório. Quando se aproximou da entrada, viu o homem que não tem deficiência aparente, caminhando até o carro parado na vaga especial.
O cadeirante se meteu de pato a ganso e foi chamar a atenção do motorista acima da lei de acessibilidade. O Garanhão ouviu comentarem que ele teria tentado explicar: “Fui chamar sua atenção. Mas ele me constrangeu fisicamente"...
Disseram para o Garanhão que logo eles começaram a trocar insultos e o policial xingou o outro de “aleijado fulho da pita”. Aí, revoltado, injuriado e enojado, o ofendido cuspiu na direção do delegado. Cuspiu, porque não tinha como dar uma tapopna nas fuças do outro.
A cusparada atingiu o vidro do automóvel. O vidro e suas adjascências. Uma das adjascências foi, exatamente, a cara do delegado. Uns respingos. Sabe aquela cusparada que sai em forma de paraqueda aberto? Pois é, espalhou em formas de pingos. Quem sabe até pingos e respingos merecidos. Nem tanto pela troca de gentilezas, mas pelo desrespeito à lei que ele jurou servir e fazer cumprir.
Aí, o escarrado sacou uma arma e perguntou se o cuspidor queria morrer. Foi ali que o cadeirante começou a desconfiar que o cara era policial. Virou o rosto. O Garanhão também virou. O que veio a seguir, ele só sabe mesmo de ouvir falar.
As pessoas que passavam pela rua saíram correndo de cena. Mas, um cara lhe disse que ouviu o cadeirante relatando o susto: “Quando ele mirou na direção da minha cabeça, só consegui virar o rosto”. O Garanhão ficou sabendo que o rapaz da cadeira ficou paraplégico aos 17 anos após levar um tiro na coluna durante um assalto.
Os populares contaram para o curioso Garanhão de Pelotas que o advogado garante que recebeu uma coronhada na cabeça e que teve o rosto atingido pela ponta da arma. Disseram também que o delegado negou ter sacado a pistola.
O Garanhão ficou sabendo que sobre o fato de o policial ter estacionado em uma vaga exclusiva, o causídico defensor do invasor de estacionamentos privativos afirmou que a noiva do seu delegado, grávida de 4 meses, não se sentia bem.
Foi então que, do alto de sua longa experiência como criminalista de escol, o Garanhão de Pelotas discursou, para uma pequena platéia que já o cercava, que tudo aquilo se tratava de um lamentável engano:
- Elementar, meus caros que estacionar o carro na vaga para deficientes é infração desalmada à lei de acessibilidade; elementar que puxar um revólver para um paraplégico é um absurdo; elementar que apontar a arma pra cabeça do desafeto é um crime anunciado; elementar que dar duas bofetadas num cadeirante é uma covardia; elementar que o delegado jamais deveria ter deixado a noiva grávida em um cartório...
- Para mim - sentenciou então o Garanhão de Pelotas - nada disso teria acontecido se, ao invés de levá-la ao cartório o delegado tivesse encaminhado sua noiva para um teste de BNH...
- BNH?!? - espantou-se um transeunte - Não seria um teste de DNA?...
- Quê DNA quê nada... Teste de BNH! O exame iria mostrar se o filho da noiva era dele, ou do vizinho que mora na casa ao lado.
E dando as costas ao grupo que se aglomerava a sua volta, tomou o rumo inverso ao da confusão. Entrou no primeiro Cyber Café que encontrou. Dizia de si para si mesmo: - O delegado deveria estar furioso por causa disso. Essas dúvidas de paternidade são terríveis. E ainda pensou pra terminar o assunto, antes de ser servido pela linda garçonete:
- Elementar que a briga não era desigual. Eram dois deficientes. Um, paraplégico; o outro, deficiente mental.