20 de jan. de 2011

Briga parelha

Na plácida tarde de segunda-feira, de um ensolarado dia 20 de janeiro, o Garanhão de Pelotas andava calmamente por uma rua do interland paulista quando viu um advogado cadeirante ser agredido por um delegado de polícia.  Ele viu tudo, mas já disse que não é testemunha nem de Jeová. A briga, nada desigual, começou por causa de uma vaga especial para deficientes físicos.

Por ouvir dizer, ele ficou sabendo que o advogado, de 35 anos, se dirigira de carro a um cartório no centro da cidade. À cata de uma vaga exclusiva na rua, encontrou outro veículo estacionado nela.
O motorista deficiente encontrou um lugar mais à frente, coisa assim de 200 metros, estacionou e, em seguida, seguiu em sua cadeira de rodas até o cartório. Quando se aproximou da entrada, viu o homem que não tem deficiência aparente, caminhando até o carro parado na vaga especial.

O cadeirante se meteu de pato a ganso e foi chamar a atenção do motorista acima da lei de acessibilidade.  O Garanhão ouviu comentarem que ele teria tentado explicar: “Fui chamar sua atenção. Mas ele me constrangeu fisicamente"...

Disseram para o Garanhão que logo eles começaram a trocar insultos e o policial xingou o outro de “aleijado fulho da pita”. Aí, revoltado, injuriado e enojado, o ofendido cuspiu na direção do delegado. Cuspiu, porque não tinha como dar uma tapopna nas fuças do outro. 

A cusparada atingiu o vidro do automóvel. O vidro e suas adjascências. Uma das adjascências foi, exatamente, a cara do delegado. Uns respingos. Sabe aquela cusparada que sai em forma de paraqueda aberto? Pois é, espalhou em formas de pingos. Quem sabe até pingos e respingos merecidos. Nem tanto pela troca de gentilezas, mas pelo desrespeito à lei que ele jurou servir e fazer cumprir.

Aí, o escarrado sacou uma arma e perguntou se o cuspidor queria morrer. Foi ali que o cadeirante começou a desconfiar que o cara era policial. Virou o rosto. O Garanhão também virou. O que veio a seguir, ele só sabe mesmo de ouvir falar.

As pessoas que passavam pela rua saíram correndo de cena. Mas, um cara lhe disse que  ouviu o cadeirante relatando o susto: “Quando ele mirou na direção da minha cabeça, só consegui virar o rosto”. O Garanhão ficou sabendo que o rapaz da cadeira ficou paraplégico aos 17 anos após levar um tiro na coluna durante um assalto.

Os populares contaram para o curioso Garanhão de Pelotas que o advogado garante que recebeu uma coronhada na cabeça e que teve o rosto atingido pela ponta da arma. Disseram também que o delegado negou ter sacado a pistola.

O Garanhão ficou sabendo que sobre o fato de o policial ter estacionado em uma vaga exclusiva, o causídico defensor do invasor de estacionamentos privativos afirmou que a noiva do seu delegado, grávida de 4 meses, não se sentia bem.

Foi então que, do alto de sua longa experiência como criminalista de escol, o Garanhão de Pelotas discursou, para uma pequena platéia que já o cercava, que tudo aquilo se tratava de um lamentável engano:

- Elementar, meus caros que estacionar o carro na vaga para deficientes é infração desalmada à lei de acessibilidade; elementar que puxar um revólver para um paraplégico é um absurdo; elementar que apontar a arma pra cabeça do desafeto é um crime anunciado; elementar que dar duas bofetadas num cadeirante é uma covardia; elementar que o delegado jamais deveria ter deixado a noiva grávida em um cartório...

- Para mim - sentenciou então o Garanhão de Pelotas - nada disso teria acontecido se, ao invés de levá-la ao cartório o delegado tivesse encaminhado sua noiva para um teste de BNH...
- BNH?!? - espantou-se um transeunte - Não seria um teste de DNA?...
- Quê DNA quê nada... Teste de BNH! O exame iria mostrar se o filho da noiva era dele, ou do vizinho que mora na casa ao lado.

E dando as costas ao grupo que se aglomerava a sua volta, tomou o rumo inverso ao da confusão. Entrou no primeiro Cyber Café que encontrou. Dizia de si para si mesmo: - O delegado deveria estar furioso por causa disso. Essas dúvidas de paternidade são terríveis. E ainda pensou pra terminar o assunto, antes de ser servido pela linda garçonete:

- Elementar que a briga não era desigual. Eram dois deficientes. Um, paraplégico; o outro, deficiente mental.