O Garanhão de Pelotas acordou achando que o mundo é um circo e a vida um carnaval. Estava com os bofes virados. Depois do desjejum foi à garagem, escolheu o Bentley Continental Supersports e saiu devagar pela rampa que cortava a grama verde-bandeira nacional e levava à alameda onde ficava o seu requintado solar, refúgio residencial de uma das regiões mais valorizadas de Acapulco.
Corria o ano douradíssimo de 1970, tão dourado que até o Brasil foi tricampeão mundial de futebol, jogando em Guadalajara, no mesmo México que o nosso personagem escolhera para ser uma das mentes mais brilhantes da Diretoria Executiva de Publicidade e Marketing da Pepsico - gigante do ramo dos refrigerantes que, por capricho de Joan Crawford, combatia o império da Coca-Cola.
Na operação saída, o Garanhão interrompeu a marcha ré para não atropelar um garoto, filho do vizinho ao lado direito de sua morada. O garoto choramingava. Ao frear, o executivo dos refrigérios percebeu que a poucos passos do menino, estava a senhora que ocupava o palacete à esquerda de seu frontispício. Uma jararaca entruda que, seguidamente, bisbilhotava a vida dos outros por trás das cortinas de seus enormes janelões. Estava com cara de furiosa. E o garoto com cara de susto.
O Garanhão desceu do Bentley e resolveu entrar na sua primeira história do dia. Pegou o menino pelo braço, levou-o até onde se encontrava a vizinha enorme e pesadona, para saber do que se tratava:
- O que foi que aconteceu - perguntou ao garoto, já na frente da mulherona.
- Ela me bateu.
- Por que a senhora fez isso, madame?
- Porque ele me chamou de gorda!
- Ora, ora. E a senhora acha que batendo nele vai emagrecer?!?
Pegou o menino, conduziu-o até a porta de sua mansão e deixou a irrritadiça bisbilhoteira parada no calçadão cercado de flores. Definitivamente, o dia não começava lá essas coisas.
RODAPÉ - A conduta é um espelho em que cada um mostra a própria imagem.