21 de ago. de 2011

RECORDISTA MUNDIAL

Usando um dos meus múltiplos e bem dotados personagens, fiz história no futebol como Aranha Negra, o melhor goleiro de todos os tempos nas tardes de sábado da Charqueada São João.

Como se não bastassem as inigualáveis temporadas invictas consecutivas, de 1990 a 1999, levei meu time à vitória no torneio início do glorioso ano 2000, conquistando nos pênaltis, o primeiro título do terceiro milênio da humanidade.

Um feito que só poderá ser superado depois de passados esses próximos mil anos e, assim mesmo, se alguém repetir a façanha de pegar, como eu peguei, os cinco pênaltis da primeira série e os outros dois que foram cobrados contra mim, até que eu mesmo, bancando o Rogério Ceni, fosse lá cobrar a penalidade que, já no papel de Garanhão de Pelotas converti no gol da vitória que os atacantes saladeiros até então não tinham conseguido marcar.

Pronto, eu acabara de me consagrar como Aranha Negra, o primeiro goleiro do mundo a segurar, uma atrás da outra sete penalidades máximas. Conta de mentiroso, mas um feito memorável, um recorde mundial insuperável.

Na semana seguinte, diante do tédio de carregar nas costas a proeza de ser o único guarda-valas a defender sete penalidades consecutivas na história do futebol, resolvi deixar o gol e o Aranha Negra para trás, para desempenhar a função de center forward já como Garanhão de Pelotas.

Era a primeira partida pra valer do terceiro milênio. A um minuto de jogo, meti um golaço de calcanhar. Nem o hoje combalido Sócrates faria igual. Pronto, outra façanha imbatível. Só daqui a mil anos, alguém terá chance de superar meu desempenho, e ainda assim terá que ser com um gol de letra marcado antes dos primeiros 60 segundos da competição.

Diante daquele empate em um gol e como estava em disputa o Troféu Carlinhos Mazza, eterno patrono da Charqueada São João, a posse da taça seria decidida em cobrança de pênaltis.

Tantas quantas fossem necessárias para apontar o vencedor. Como reconhecido atacante matador, eu fui escalado para ser o único e indivisível cobrador.

Naquele tempo, um só atleta - na verdade, o craque do time - cobrava as penalidades máximas. Mais que justo, posto que sempre e isso perdura até hoje, foi só um goleiro, nada mais que um único arqueiro, o encarregado de dar conta do recado.

Pelo sorteio, eu fui encarregado de bater primeiro as cinco penalidades. Fui lá e bati. Errei todas, uma atrás da outra.

Como o atrevido goleiro deles tinha agarrado os três primeiros pênaltis, eu bati os outros dois para fora, de propósito. Aqui ó, que ele iria igualar o recorde do Aranha Negra!

Até hoje eu não sei se o ponta-de-lança deles lá converteu algum dos pênaltis que bateu contra nós. Só sei que tão cedo não vai aparecer um craque com a devida estatura para quebrar o meu segundo recorde mundial no futebol de todos os tempos.

A não ser que algum Elano seja escalado por alguém parecido com um Mano Menezes para decidir alguma competição pela seleção brasileira.

MORAL DA HISTÓRIA – Triunfar é tirar partido das debilidades humanas e jamais compartilhá-las.

20 de ago. de 2011

GARANHÃO DE PURA ESTAMPA
Os ventos que movem hoje os moínhos do Garanhão de Pelotas
são apenas tornados.

5 de ago. de 2011

A SURDEZ DO RICAÇO ESPERTO

Te mete! Ninguém dava nada por ele, quando - com um diploma embaixo do braço - o Garanhão de Pelotas  virou otorrinolaringologista. Virou otorrino mais por se deliciar ao ver seus pacientes não pronunciarem direito o nome completo de sua especilização do que por vocação e profissão.

Montou uma clínica no centro da metropole da Zona Sul - paraíso de compras e vendas dos moradores de pelo menos 20 cidades ali das redondezas. Só atendia gente rica. É que rico também tem dor de ouvido, de cabeça e gargantilha.

Naquele tarde, sua agenda de consultas reservava para a última hora do expediente - trinta minutos antes do happy hour - uma sessão de revisão geral nos ouvidos de Dom Pérrignon XVI, já com 72 anos de idade, vetusto descedente do monge aquele que "sorvia estrelas".

Era um produtor de vinho da colônia, concorrente direto do Emílio Ribas, senhor de um vinhedo que não dava bola, nem bolinha para Champagne - uma região francesa que emprestava o nome para uma bebida bem parecida com o vinho em garrafão colonial.

Pois, por pura sorte, Dom Pérrignon XVI ficou bilionário. mais até do que esses consultores republicanos que fazem negócios de botar dinheiro da vida pública na privada. Com seus 72 anos bem vividos, estava casado já há seis meses com uma jovem de 20 anos, perdidamente apaixonada por ele.

No horário marcado, em pontinho, o paciente chegou, para a revisão dos aparelhos auriculares que lhe enganavam a surdez. O galante otorrino, atendeu-o com a gentileza que sempre dispensava aos portadores de polpudos talões de cheque. Todo sorrisos e afabilidades. Assim que o ancião entrou, o médico foi puxando conversa:

- E aí Dom Pérrignon, o senhor vai bem? E sua jovem esposa, como vai?
- Tudo bem, tudo bem...
- E o aparelho auricular fez efeito?
- Fez. Uma beleza!
- E sua esposa já sabe disso?
- Quê nada...
- Você não disse nada, não fez nada?
- Fiz. Já mandei alterar o testamento.

O Garanhão  fingiu-se surpreso. E logo aproximando-se do ouvido do velhote ricaço, disse-lhe em tom de confidência:

- Sabe, Dom Perrignon, eu nunca entendi como o senhor conquistou o coração daquela menina...
- Barbada, meu bom doutor, eu menti pra ela que tinha 87 anos.

Pronto. Desfeitos todos os mistérios. A revisão nos aparelhos foi minuciosa e Dom Pérrignon saiu dali escutando melhor do que nunca.

MORAL DA HISTÓRIA - Só cai no conto do vigário aquele que pretende passar o vigário para trás.

O ASSALTO

Faz tempo isso, mas como sempre, o parque de estacionamento estava lotado. O Garanhão de Pelotas  resolveu usar suas credenciais de lobista oficial de negócios relacionados com coalizão pela governabilidade e dirigiu-se ao estacionamento interno do ministério.

Não era mais do que três e meia da tarde. O nosso grande executivo, hábil piloto de um silencioso Honda Civic Hybrid mal encaixara a máquina vermelho-sanguessuga na vaga, quando viu que algo de estranho acontecia naquele lugar escuro e desértico do órgão público.

Estrategicamente, escondeu-se atrás da primeira coluna da garagem próxima ao veículo que lhe parecia familiar e, em silêncio, conseguiu observar o estranho acontecimento. Viu tudo. Era um assalto-relâmpago. Escutou direitinho:

- Mãos ao alto! Passe todo o seu dinheiro!
- Você sabe a quem está assaltando?
- Não.
- Eu sou o ministro dos Transportes.
- Então, passe todo o meu dinheiro!

O Garanhão, trancando o riso, deixou que aflorasse o ímpeto do grande herói que há dentro dele. Saltou de trás da coluna e gritou alguma coisa assim como "você está preso!". Foi o que bastou.

O bandido saiu em desabalada carreira deixando para trás a idéia do assalto. O ministro não sabia como agradecer ao seu providencial salvador. Isso, no entanto, não foi problema. Graças àquele ato de bravura, os tempos que se seguiram foram todos de vacas gordas. E muito bons e rentáveis, enquanto o ministro foi ministro.

Claro, o Garanhão religiosamente, pagava os tradicionais 10% do que recebia por seus prestimosos serviços como mais um dos grandes consultores da Esplanada dos Ministérios, para o assaltante frustrado que, ao primeiro grito de "teje preso!" fugira desabaladamente pela rampa do estacionamento oficial.

MORAL DA HISTÓRIA - Ambos estão perdoados por 100 anos.

4 de ago. de 2011

GORDO - O CONSELHEIRO

Em matéria de política, o Garanhão de Pelotas sempre contou com um grande consultor para assuntos de qualquer natureza - de rombo a roubo; de atalhos a desvios; de malversação a boa conversação: O Gordo - seu irmão de fé, amigo e camarada para todas as jornadas.

Quando abriu sua empresa de Consultoria "Programa de Aceleração e Crescimento", seu patrimônio só aumentou graças aos conselhos e ao jogo de cintura que o Gordo lhe repassava.

Certa feita, desencantado da vida e desiludidio com algumas atitudes do Pai dos Pobres como proprietário intocável e mandachuva absoluto do governo da sua pátria amada, o Garanhão  estava decidido a largar tudo e voltar a ser um outro personagem qualquer desse enorme sítio de pica-paus, tucanos, picaretas e outras aves raras.

Andava chateado, com as frequentes explosões de mau humor e grossura que o Cara distribuía a torto e direito pra cima de todo mundo. Foi quando ouviu os conselhos do notável, mas não imortal, conselheiro Gordo:

- Garanhão, mermão... Tenha calma. O homem é bom.
- Como assim?!?
- Ele é que nem o Hitler, pô.
- Não tô entendendo.
- Seguinte: o Hitler era um cara bom...
- Bom?!?
- Era. O Hitler era um cara bom... Só não gostava de ser contrariado.

Dito isto, sorveu um bom gole da cervejinha de sempre e foi tratar da vida que a noite era sempre criança para ele. Ele adorava criança. Gostava de todo mundo. Do Hitler, do Cara... E do Garanhão que, por causa dele, ganhou muita grana como um dos grandes magos da consultoria republicana.

MORAL DA HISTÓRIA - Há alguns defeitos tão estreitamente relacionados com algumas virtudes que, às vezes, até podemos extirpar os vícios e as maldades, sem arrancar o que há de bom em uma lá que outra criatura "não comum".

GARANHA'S SOUTH LAKE CLINIC

Logo que deixou a presidência da República, o Dr. Honório Card começou a sentir-se meio deprê, meio depauperado. Antes mesmo de começar a provar que o mensalão foi "uma farsa", ele resolveu procurar um psiquiatra. Algumas sessões não lhe fariam mal nenhum.

Mesmo sem desencarnar do governo, descartou logo os médicos do corpo oficial do Palácio do Planalto. Já bastava a azia que estava sentindo diante dos que os jornais escreviam a respeito dos quatro guarda-costas que os cofres públicos lhe garantem.

Correu o dedo na lista telefônica - ele ainda não descobriu o Google - e parou no Garanhão de Pelotas. Encantou-se.

- Taí ó, esse cara eu já ouvi falar dele. Eu mesmo, uma vez até falei pra um prefeito de lá que esse Garanhão  fazia parte de uma fábrica de sapecas - falou Dr. Honório para si mesmo.

Acionou sua legião de assessores e porta-vozes e logo, logo a primeira sessão estava marcada. Deu-se numa sexta-feira, no complexo clínico "Garanha's South Lake Clinic". Sem espera alguma - que o Garanhão não dá bola para o SUS - foi atendido em seguidinha.

- Dr. Honório, pode começar pelo princípio.
- No princípio eu criei o céu e a terra...

Aquilo foi só o início. A clínica do Garanhão  ganhou muito dinheiro; cresceu e multiplicou-se. O Garanhão  é que, por muito tempo, precisou de um cuidadoso tratamento psiquiátrico

MORAL DA HISTÓRIA - Quando é assim, o melhor é contrariar!

OPS! MUITO PRAZER.

Cena de balada. Clima de boate desse terceiro milênio, onde até os mais jovens são do século passado. Pois o Garanhão de Pelotas fez o seu primeiro xixi no mundo 21 anos antes que irrompesse a aurora do primeiro dia do ano 2000. Não é nada, não é nada, ele é de 1989 - quase uma lenda viva.

E lá estava ele com seu chopinho bem-tirado na mão, atravessando a pista congestionada por aves raras de todas as espécies - homens e mulheres de todos os sexos e aniversários - quando esbarrou inadivertidamente num baladeiro parrudão. Molhou a camisa do cara que, por sua vez, emborcou a própria tulipa de chope no chão...

- Ops, desculpe - disse amável o Garanhão.

A resposta foi um muchocho à beira de um rosnar e de um olhar fulminante em sua direção. O Garanhão não se abalou. Estava ali pra se divertir. Tentou mostrar que era de boa paz. Colocou amigavelmente a mão sobre o ombro do irrascível boêmio de arrabalde e convidou-o com um sorriso conciliador:

- Foi mal, cara. Venha comigo até o balcão, vou te pagar um chopinho novinho em folha...
- Sai de mim, cara... Eu queria tomar é aquele ali que você jogou fora...
- Quiéisso, parceiro... Faço questão, te pago um geladinho de colarinho maduro...
- Sai pra lá, eu quero é aquele ali no chão.
- Não faz assim, cara. Não procura encrenca, eu não sou de briga.
- Olhaqui, babaca! Você não é, mas eu sou. Tu sabe com quem cê tá falando?- indagou dizendo o truculento, já enrolando a língua e triturando o português.
- Sei não, amigo. Mas...
- Eu sou polícia. Polícia federal!
- Pô, parceirão, polícia federal? E além desse, quê outro defeito tu tem?! - debochou o Garanhão.
- Tu não entendeu, mané? Sou polía federal!
- Muito prazer, eu cheguei ontem do Japão...
- E eu com isso, por que ocê não ficou por lá?!? - continuou o implicante.
- Porque eu vim comemorar com a minha turma o título de campeão mundial de kickboxer que acabei de ganhar em Tokio!

Deliciou-se com a cara do provocador, deu meia volta, não pagou chope nenhum para o pitbundão e foi gozar as delícias de mais uma festa no Brasil, antes de voar na manhã seguinte para a Lituânia, onde tinha mais um torneio internacional pela frente. Um torneio de... Golfe.

MORAL DA HISTÓRIA - A cortesia é é um artifício das pessoas de boa paz para manter à devida distância os estúpidos e brutamontes.

CORREDOR DE MINISTÉRIO

Já faz algum tem o Garanhão de Pelotas  cumpria a sua rotina de lobista pelos corredores do Ministério dos Transportes de Valores do Brasil. Andava ali pelo terceiro andar quando, de repente, saíram de braço dado do gabinete o ministro e um deputado que mandava e desmandava na pasta.

Nem se deram ao desplante de reparar na presença do Garanhão. Seguiram batendo um papo descontraído na direção do elevador. Era mais de cinco da tarde e o happy hour não podia esperar. O nobre frequentador dos corredores ministeriais escutou a conversa que os dois ilustres senhores jogavam fora:

- Ministro, você viu o relógio que o Pagot estava usando?
- Não, não vi... Me mostra.

MORAL DA HISTÓRIA - Nos corredores dos ministérios os bastidores andam de braço dado. Mais do que ouvido é preciso ter olho vivo.

3 de ago. de 2011

O FISCAL E O PESCADOR

O Garanhão de Pelotas  cumpria mais uma missão ministerial, como fiscal federal do Departamento de Escoamento da Produção do Ministério da Agricultura. Andava pelas beiradas da ponte da Amizade que liga o Brasil ao fim da picada, logo ali depois da Foz do Iguaçu.

Foi pelas quebradas - que ele não é maluco nem nada para seguir aquele caminho natural da rota da produção. Pelas cercanias da ponte, ele deu de cara um muambeiro que, mesmo sem saber de quem se tratava aquela figura imponente que se aproximava com pés de algodão, fingiu que estava pescando.

O Garanhão aprochegou-se do pescador e puxou conversa mole:.


- Você está fazendo o quê aí, amigo?
- Pescando…
- Já pescou alguma coisa?
- Xiiii…Uma cacetada…Peguei peixe de tudo que é espécie, tamanho e feitio!
- Você sabe quem eu sou?
- Não…
- Sou fiscal do governo e aqui é proibido pescar!
- E você, sabe quem eu sou, senhor fiscal?
- Não faço a menor idéia…
- Sou o maior mentiroso do mundo!

O Garanhão  sorriu e deixou tudo por isso mesmo, afinal, o próprio ministro da Agricultura vivia alertando que era a favor de uma viligância mais branda, por que "fiscalização é um negócio antidemocrático". Era bem como o próprio mandachuva vivia repetindo, "detesto toda e qualquer atitude que possa sequer lembrar que vivemos num regime policialesco".

A firme convicção do ministro deu ao Garanhão de Pelotas  a certeza de que o melhor mesmo era deixar pra lá. O muambeiro tinha se saído bem. E, se há uma coisa que o Garanhão  admire nas pessoas é a presença de espírito.

E, além do mais, aquilo ali não é nada, não é nada, não era nada mesmo. O que significava aquele contrabandozinho ali na fronteira de Foz do Iguaçu, diante do estouro da boiada lá na Rússia e o escândalo que fez a Conab se transformar no Denit do Ministério da Agricultura?!?

MORAL DA HISTÓRIA - Se não se pega peixe graúdo, por que vai se fisgar um lambari?!?

O CASAMENTO NA AUSTRÁLIA

Pois o Garanhão de Pelotas, depois que passou de lorde falido para o mais bem-sucedido cidadão do mundo, sempre acalentou um sonho na vida. Trocar sua solteirice bem garantida da convivência com suas três secretárias executáveis, por uma vida pacata e cheia de ternura com uma esposa, amada, amante por todo o tempo do mundo, assim eterna enquanto estivesse acesa a chama que os versos alexandrinos e as rimas espúrias de Vinícius lhe inspiravam.

Estava a um passo de fazer da quimera uma realidade. Naquele novo amanhecer, levantou-se expedito como nunca e diligente como sempre. Cumpriu seus rituais de começos cotidianos - da escova de dentes ao desjejum e à escolha do traje de alto executivo da sua multinacional australiana.

Já estava instalado confortavelmente na poltrona de seu gabinete no centro de Brisbane, na Queen Street, calçadão comercial da cidade.

Dali, vendo pessoas pelas ruas, descortinando os edifícios históricos das redondezas do porto, rememorava rápidas a/venturas por aqueles pubs antigos que apareciam ao largo do Jardim Botânico.

Deixou de lado o romantismo no meio da manhã daquela terça-feira, para organizar-se rumo à realização do seu antigo sonho. Telefonou para a secretária loira:

- 'Morning, Marilyn Lewinskovka. Você cancelou, como eu lhe pedi, todos os meus compromissos para este fim de semana?
- Oh yes, my boss...
- E está tudo bem?
- Oh yes, my lord... Só tem uma coisinha...
- Uma coisinha?
- Yes, my love... A sua noiva ficou furiosa porque eu desmarquei o casamento de vocês no sábado!
- Oh, my God!...

O Garanhão  bateu o telefone. O casamento não saiu. Passado um breve tempo, o atarefado representante da nova geração de líderes empresariais da Austrália, não só concedeu o seu perdão à diligente secretária, como a promoveu a diretora-presidente do saltitante trio de auxiliares que o acompanha até hoje a qualquer canto do planeta, para o que der e vier.

MORAL DA HISTÓRIA - O destino acaba sempre rindo das probabilidades, mas quem ri do destino descobre a fortuna e a sorte.

2 de ago. de 2011

UM PORRE À MEXICANA

O Garanhão de Pelotas  estava em meio a mais uma reunião do conselho de propaganda da empresa de Joan Crawford, em Acapulco, quando o celular vibrou em seu peito fazendo o jacarezinho Lacoste saltitar no bolso da camisa esporte que o separava dos demais conselheiros.

Surpresa! Era Remi Gorga! Orra meu, Remi Figurelli Gorga Vírgula Filho! Ele estava no México. Na capital. Em missão cultural. Era adido em Quito, no Ecuador. E com ele sempre foi assim, onde há Remi há sempre algo que termina em dor. Tinha que ser Ecuador. No bom sentido, é claro.

A dor naquele caso, era de saudade dos velhos tempos de pautas jornalísticas no eixo Brasília-Porto Alegre. Fazia duas décadas que não se falavam. Combinaram logo um encontro para aquela noite e, pronto, o Garanhão  pegou um Lear-Jet da Companhia e se mandou para Mexico City.

De noite, conversaram, mentiram, mataram saudade contando histórias que nenhum dos dois lembrava mais e, evidentemente, beberam todas. Quase comeram algumas. Mas, não era noite para aquilo. Melhor tequila com sal e limão na cavidade do punho que não mata a fome, mas mitiga a sede e dá um porre que beira o coma alcoólico.

Na porta do restaurante, onde - entre tacos, champurrados, bacanoras, barbacoas, buñuelos e burritos, tinham sorvido Dry Martinis pra começar, Koskenkorvas para fartar e tequilas para terminar - orientaram em jogral o taxista da melhor maneira que a língua lhes permitia enrolar o idioma:

- Por favor, nos leve já até o hotel coisa...
- Hotel coisa, onde fica isso?
- Pô, bem ali defronte ao Palácio coisa...
- Coisa?
- É, siga em frente que quando a gente chegar a gente avisa.

Sabe-se lá como, eles chegaram. O Garanhão  e Remi ocuparam a mesma suíte no 58° ou no 92° andar do Four Seasons Hotel Mexico City - não estavam lá com muita capacidade de direção, imagine se teriam noção de altura. E aí se esbaldaram. Caiu cada um na sua cama; em cada cama um quase coma.

Correu a noite. Dormiram que nem duas pedras. Chumbaram. Desmaiaram de ebriedade. Por volta de oito horas da manhã, Remi acorda em sobressalto. E, por absoluta solidariedade, acorda também o Garanhão de Pelotas.

- Orra, Garanhão  que porre!
- É. Que porre!...
- Olha só, a suíte parece que está balançando. Tá tudo rodando.
- É. Tá tudo rodando... Tá tudo balançando...
- Tá balançando pra você também, é?!?
- Tá, cara. Tá tudo rodando e sacudindo...

Aí, Remi teve um ataque de lucidez anti-etílica e telefonou para a portaria do hotel:

- Alô.
- Alô. Que pasa señor?
- No pasa nada, señor... Es un temblor...
- Temblor? Ah bom.... Ah bom, nããão! Aaaaii ! É um terremoto!

Ele e o Garanhão não levaram mais do que dois minutos para trocarem de roupa, socarem tudo nas malas e descerem degrau por degrau quase cem andares até à porta da rua. Estavm bêbados, mas não eram loucos de entrar num elevador em dia de temblor.

Pegaram o primeiro táxi que passou e balançaram com ele pela avenida tremelicante até chegar ao aeroporto. Despediram-se rapidamente. E foi cada um pro seu canto. Remi Gorga para Quito e o Garanhão  para Acapulco.

MORAL DA HISTÓRIA - Há porres que não vêm para o bem e que fazem até mal. De qualquer maneira, aquela tremedeira toda foi culpa dos champurrados, certamente. A amizade dos dois jamais foi estremecida.

UM AMANHECER EM ACAPULCO

O Garanhão de Pelotas  acordou achando que o mundo é um circo e a vida um carnaval. Estava com os bofes virados. Depois do desjejum foi à garagem, escolheu o Bentley Continental Supersports e saiu devagar pela rampa que cortava a grama verde-bandeira nacional e levava à alameda onde ficava o seu requintado solar, refúgio residencial de uma das regiões mais valorizadas de Acapulco.

Corria o ano douradíssimo de 1970, tão dourado que até o Brasil foi tricampeão mundial de futebol, jogando em Guadalajara, no mesmo México que o nosso personagem escolhera para ser uma das mentes mais brilhantes da Diretoria Executiva de Publicidade e Marketing da Pepsico - gigante do ramo dos refrigerantes que, por capricho de Joan Crawford, combatia o império da Coca-Cola.

Na operação saída, o Garanhão interrompeu a marcha ré para não atropelar um garoto, filho do vizinho ao lado direito de sua morada. O garoto choramingava. Ao frear, o executivo dos refrigérios percebeu que a poucos passos do menino, estava a senhora que ocupava o palacete à esquerda de seu frontispício. Uma jararaca entruda que, seguidamente, bisbilhotava a vida dos outros por trás das cortinas de seus enormes janelões. Estava com cara de furiosa. E o garoto com cara de susto.

O Garanhão desceu do Bentley e resolveu entrar na sua primeira história do dia. Pegou o menino pelo braço, levou-o até onde se encontrava a vizinha enorme e pesadona, para saber do que se tratava:

- O que foi que aconteceu - perguntou ao garoto, já na frente da mulherona.
- Ela me bateu.
- Por que a senhora fez isso, madame?
- Porque ele me chamou de gorda!
- Ora, ora. E a senhora acha que batendo nele vai emagrecer?!?

Pegou o menino, conduziu-o até a porta de sua mansão e deixou a irrritadiça bisbilhoteira parada no calçadão cercado de flores. Definitivamente, o dia não começava lá essas coisas.

RODAPÉ - A conduta é um espelho em que cada um mostra a própria imagem.

O GARANHÃO E AS HARLEY DAVIDSON

O Garanhão de Pelotas  estava em plena temporada de caminhoneiro brasileiro no Texas. Queria aprender a falar a língua do Tio Sam com todos os sotaques. Cansado de ser turista, resolveu dar uma de trabalhador em busca de pequenas aventuras por grandes rodovias naqueles desertos do primeiro mundo americano.

Green card e tudo no porta-luvas, o Garanhão  resolveu dar uma parada num daqueles restaurantes de beira de estrada no meio do nada que não fosse apenas um posto de abastecimento da Texaco.

Saboreava sozinho - já que não havia sinal de mais nenhum cliente - um saudável copo de leite gelado com um farto donuts, quando entram no salão três motoqueiros típicos montadores de possantes Harley Davidson, parrudos, sujões, mal-encarados e vestidos com aquelas roupas de couro preto, cheias de penduricalhos cromados, tatuagens e piercings em profusão, coisas assim que exibem força e valentia dos que chegam em bando.

O mais feio chegou-se ao Garanhão  e apagou o cigarro no donuts dele e foi se sentar lá na ponta do balcão. O outro mais feio que o mais feio, foi até o Garanhão  cuspiu no copo de leite e sentou-se na outra ponta do balcão. Aí, o mais feio que os outros dois mais feios, aproximou-se e virou o pratinho de donuts no colo do Garanhão. Este ficou por ali mesmo, bafejando no cangote do nosso então pacato caminhoneiro incidental.

Sem dizer absolutamente nada, sem mover um só m´suculo da face, sem demonstrar qualquer reação animal, o Garanhão  levantou-se, pagou a conta, botou o boné e foi embora, na mais santa paz.

Coisa de dois ou três minutos depois, o motoqueiro mais feio disse com voz de valente para o calmo e imperturbável garçom:

- Esse cara não era homem!
- Nem homem, nem bom motorista...
- Como assim?
- Ele acabou de passar com o caminhão por cima de três motos que estavam ali fora.


MORAL DA HISTÓRIA - Não há nada melhor do que devolver àqueles que me causam algum dano, do que devolver-lhes danos muito maiores. Nem há melhor vingança do que podermos nos vingar.

1 de ago. de 2011

O LÍDER

Por mais que lute e relute consigo mesmo, o Garanhão de Pelotas  tem uma coisa assim por dentro que não o deixa mentir. Não é sempre. Mas há dias em que ele é assim e pronto.

Estava o nosso nobre numa daquelas noites de happy hour interminável em Brasília. Tinha começado a bebericar com os colegas deputados, senadores e lobistas, desde cedo. Saíra de um dos Ministérios em que mandava e desmandava por volta de seis e meia da tarde já com espírito de porco.

Passou pela Churrascaria do Lago, se esbaldou numa Koskenkorva com nacos de laranja em casca, sentiu-se mais líder do que nunca e, abandonando suas cansativas amizades resolveu ir sozinho e mal acompanhado ao Gaf - um bunker, boate-bar-restaurante da moda, lá nos escurinhos do Gilberto Salomão - ilhota de grandes aventuras pretéritas na Capital da República.

Um pouco antes, passou pelo restaurante e choperia Bierfass na esquina daquela antiga vida agitada brasiliense, deu uma canja ao piano da casa, cantando Night and Day à moda Sammy Davis, bem melhor que Frank Sinatra homenageando Cole Porter.

Encaminhou-se para o Gaf. Entrou com seu mais despojado ar de nobreza e, só por isso, a boate se iluminou como se lua crescente tivesse ficado prenhe e, assim, cheia de si mesma tivesse invadido o salão. Seu olhar de lince caiu numa mesa redonda ocupada por quatro amigas estonteantes, alegres, descontraídas, bonitas, cercadas de queijos e vinhos.

O Garanhão  dirigiu-se garboso e tentador para o balcão, onde já o esperava uma finlandesa Koskenkorva congelada, rodeada por laranjas in natura. O olhar do quarteto arrasador convergiu todinho para a figura de displicente elegância. Um par de olhos, no entanto, sobrepujou aos outros. Eram os olhos de Maria Rita. Olhos vivos, espertos que a levaram a tomar a dianteira sobre as demais companheiras sequiosas por aquele bom-partido:

- Gurias, olhali, olhali o meu ídolo! É ele! O Garanhão de Pelotas!!!!!!
- Quiéisso, menina?!? - espantou-se Dolores Sierra.
- É eeele, é eeele, meu ídolo, meu líder! Não acredito. Ele está aqui. Minha paixão.
- Você endoidou, guria - disse Isabel, moderadora.
- Quê quieu faço? Não posso perder essa chance... E ele tá me olhando, me olhaaaando!!!
- Então, dá um jeito. Chama o garçom e manda um torpedo - aconselhou Maria Joana.

Não demorou nada o torpedo foi detonado. Enquanto acertava o alvo, Maria Rita disse que para motel não iria com aquele seu ídolo maravilhoso, líder fantástico de suas jornadas de juventude rebelde com causa, de sonhos revolucionários e coisas assim que mudariam o Brasil se tivessem dado certo.

Isabel, louca para acabar com aquele mini-escândalo, foi lépida e faceira:

- Tome, pegue aqui a chave do meu apartamento. Eu e Maria Joana dormiremos nop apê da Dolores e você carrega o seu líder para o meu refúgio. Fique lá até a hora que quiser. Amanhã no almoço a gente se fala. E você nos conta as novidades.
- Combinado - disse Maria Rita, agradecida.

Passaram-se duas ou dez vodcas para o Garanhão  e uma garrafa e meia de vinho para Maria Rita e suas amigas, até que o torpedo fez efeito. Consumada a aproximação, Maria Rita e o Garanhão de Pelotas  saíram de braço dado e muito íntimos, pela porta principal do Gaf, deixando a noite quase sem brilho para trás.

As outras três amigas ainda estavam imaginando loucuras à bordo da mesinha de degustações, namoriscos alhures e mais vinho de idioma chileno com sotaque do Vale de Maipo, quando o telefone de uma delas tocou. Não eram duas horas da madrugada, ainda. A voz de Maria Rita reverberava nos ouvidos de Dolores Sierra:

- Gurias, gurias... Você não vão acreditar... Venham pra cá, venham pra cá - apelava a namoradeira.
- Mas, o que foi que houve?
- Nem conto nada procês... Venham, venham pra cá. Vamos terminar a noite por aqui.

Logo as três amigas se mandaram para a Asa Norte, morrendo de curiosidade. Loucas para saber as novidades. Invadiram o apartamento e ficaram frente a frente com Maria Rita, sozinha, vestida dos pés à cabeça e morrendo de rir no enorme sofá da confortável sala. Morria de riso nervoso.

- O que foi, sua maluca; o que foi que aconteceu? - quiseram saber as três.
- O meu líder é um horrooooor!
- Como assim? - tentou saber Isabel.
- Um horror, esse líder é um pavoooor!
- Brochou? - perguntou Maria Joana
- Pior... Que líder de merda!
- É picorrucho; tem aquilo roxo?... - tentou adivinhar Dolores.
- Quê nada. Que nada, não! Quê tudo! O cara é brocha; é picorrucho e grosso, sem noção!
- O que foi, então, conta logo - implorou o trio afinado e a uma só voz.

Aí, Maria Rita não aguentou e, aos risos largos e nervosos, contou o diálogo que mandou para os porões das mais frias noites de desilusão o que nem bem tinha começado a acontecer e já terminara:

- Chegamos aqui abraçados. Caímos nesse tapete aqui ó. Nos beijamos, meio que nos mordemos devagarinho, fomos tirando as roupas e eu, eu enloqueci nos braços daquele meu herói da juventude; aquele meu ídolo; meu líder...
- E aí, aí?... - quiseram saber mais.
- Aí eu consegui falar com ele... Quase sufocando.
- O cara é tardo, te bateu? Conta logo, porra!

E ela então descreveu a cena. Ele já estava sentado no sofá. Aquele homão, seu ídolo, seu líder.. E ela não resistiu. Ela própria que ronrornou para o líder:

- Vem, meu líder... Vem me faz sentir mulher.

O Garanhão de Pelotas  prontamente tirou a roupa e jogou-a para os seus braços abertos:

- Toma! Amanhã de manhã, você as lava e passa pra mim.

Seu mundo caiu. Maria Rita só lhe deu tempo para enfiar-se de novo nas calças e sair porta afora. Escatafedera-se ali o sonho de uma revolucionária. Seu líder era um ídolo de pés de barro.

MORAL DA HISTÓRIA - Você pensa o quê? Que o Garanhão  é que nem o Didi Mocó aquele dos Trapalhões que não perde nunca?!?