3 de set. de 2011

ÀS MARGENS DO BAILE


Era um daqueles bailes bissextos do Clube Náutico Gaúcho, ou do Regatas Pelotense, não me lembro bem, afinal estávamos ainda no limiar da era da juventude transviada. Só sei que estávamos todos lá. E como sempre, no meio do baile, armamos uma tremenda confusão.

Sei mais um pouquinho. Lembro-me bem de cada um da nossa turma: eu, Bandeira, Pé de Anjo, Sérgio Siqueira – o que estas mal traçadas linhas subscreve – Petiz, Careca, Fervido, Fernandinho Leal e Patê. Tudo boa gente.

Sem dinheiro para pagar as despesas, armamos uma brigalhada de mentira entre nós mesmos. Os sopapos eram todos nossos velhos conhecidos. Até que, de repente, quem não era do bando já estava também batendo e levando. Uma zorra. Soco daqui, cadeira dali, tabefe pra lá, bofetão pra cá, acabamos encurralados pelos sócios de verdade e pela diretoria em peso.

Fomos levados aos tropeções e empurrões – uns bicos na bunda também - para uma sala que tinha apenas uma porta para o salão de festas e dois janelões que davam para dentro d’água. Os dirigentes além de nos proteger, nos davam também um corretivo: avisaram que já tinham chamado a polícia.

Estávamos todos enfurnados lá naquele galpão, quando resolvemos dar no pé. Escaparíamos pelas janelas. Diz então o Pé de Anjo:

- Vamos fugir logo.
- É pra já – disse Bandeira já enrolando os sapatos na camisa.
- Vou nessa – gritou Petiz.
- Tô me mandando – falou o veloz Fernandinho.

Aí, o Patê deu uma de bom:

- Eu fico. Vou encarar! Se vocês quiserem podem ir. Eu fico!
- Quié isso – reclamou Fervido – vamos fugir duma vez.
- Não, eu fico e vou bater de frente com esses bolhas – teimou Patê.
- Ei Garanhão, diz pro Patê que ele não é o John Wayne – ponderou Careca.

Quando eu ia argumentar com o irredutível audaz, Patê abriu o jogo:

- Eu fico! – gritou – Eu fico... Porque não sei nadar! – sussurrou.

Aí, pronto! Dramatizamos: se fosse para o Patê morrer afogado, então morreríamos todos lutando. Ficamos todos. Confinados ali mesmo. Até o fim do baile que foi até o sol raiar. Lá pelas seis e meia da matina levamos um sermão dos diretores e, depois de darmos nossos endereços, saímos com o rabo entre as pernas. A polícia não tinha sido chamada.

RODAPÉ – Os abusados são todos compadres uns dos outros e vivem da proteção que mutuamente se proporcionam.

UMA QUESTÃO DE ÓTICA

Por um bom tempo fui assessor de imprensa do deputado Pedrinho Germano que, além de político astuto era um bom parceiro das rodas de beliscatessens. Tinha grandes tiradas. Enorme presença de espírito. E estava sempre querendo fazer o melhor pra todo mundo.

Um dia, numa visita a um bairro de Cachoeira do Sul, sua terra e reduto eleitoral, Pedrinho aceitou da dona da casa o que tinha pra comer: uma tripinha de patê, um caqui e um refresco de limão ao natural. O limão e a temperatura.

Bebeu e comeu se aquela mistura estapafúrdia fosse uma lauta ceia, devolveu o copo design requeijão e agradeceu a preferência.

Durante a mesma campanha para reeleição, Pedrinho atacava - num salão paroquial da periferia – a inércia do prefeito da cidade:

- Na minha ótica – disse olhando para a platéia – é possível combinar o corte das despesas com o crescimento da cidade!

Mal disse aquilo e foi interrompido por um dos votantes que tinha cara e jeito de ser partidário do intendente municipal:

- O senhor poderia me conseguir um par de óculos?
- Como assim? Não, meu caro, não posso.
- Mas o senhor não acabou de dizer que tem uma ótica?!?

Pegou mal. Pedrinho ficou no contrapé. Sentiu que perdeu aquele voto. O mini comício durou pouco por ali. Mais tarde, conferindo o mapa das votações, Pedrinho Germano ficou sabendo que não tinha ido muito bem naquela urna. De qualquer maneira, foi reeleito. Com folga.

RODAPÉ – Nem sempre o eleitor vê o candidato com bons olhos.