Lá se vão quarenta anos, mas lembro ainda que naquele dia eu desempenhava o papel de doutor-consultor Garanhão de Pelotas para assuntos de compra e venda de material bélico e artefatos afins.
Tinha uma entrevista marcada para as nove daquela manhã de sexta-feira no EMFA - Estado Maior da Força Aérea. E lá estávamos, eu e minha sócia Mery, para a tal entrevista que poderia render bons dividendos para a nossa multinacional e uns tirinhos lá que outros para os países pouco interessados na velha conversa do make love, not war.
Pontuais, chegamos às dez para as nove, no saguão do ministério. Devidamente identificados, nos encaminhamos para os elevadores. Havia uma fila razoável de cidadãos comuns diante de uma série de elevadores, todos à esquerda de quem entrava no corredor de espera.
Defronte, havia três elevadores, de portas abertas, guardados cada um deles zelosamente por seus respectivos ascensoristas. Na parede, acima das portas, uma placa indicativa nos colocava nos devidos lugares: Uso exclusivo de oficiais e assemelhados.
Eu já estava querendo me sentir mal com aquela discriminação, quando Mery me conduziu pelo braço para o elevador que estava sendo ocupado naquele exato momento por um major que acabara de chegar ao prédio. Mery entrou comigo à tiracolo e depois de cumprimentar o oficial com um leve sorriso, dirigiu-se à condutora do caixote móvel:
- Bom dia, por favor, quinto andar...
E lá iniciamos nós a subida rumo aos bons negócios. O major, afável, puxou assunto com Mery que estava de braço dado comigo:
- A senhora também é oficial?
- Não. Sou "assemelhada"...
- ?!?...
- Graças ao Imposto de Renda que me garante esses confortinhos extras.
E mais não disse, porque nada mais lhe foi perguntado. O elevador parou. Descemos os três. E nos dirigimos todos à mesma sala. Cerca de meia hora depois, o major nos atendeu. Não adiantaram o peso e nem a força dos nossos argumentos. Naquele dia não saiu negócio.
MORAL DA HISTÓRIA - A igualdade e o poder mantém entre si fortes laços. Às vezes, isso dá um nó na gente.